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Performances e livro-objeto, abordam “relações de poder”.

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O produto interessa aos museus, não aos artistas. O processo interessa aos artistas, não ao público. O produto diz respeito ao mercado, não à criação. O processo diz respeito aos acadêmicos, não aos fruidores. O produto só interessa aos marchands e aos executivos. O processo só interessa aos intelectuais e aos filósofos. O produto é para o consumo dos preguiçosos, não para os que querem participar. O processo é assunto para as universidades, não para o público de arte. O produto é a única coisa que fica para a história. O processo é a única coisa que fica para o artista. O produto vale pelo processo. O processo vale pelo produto.
São incontáveis os críticos, pesquisadores, historiadores, artistas, professores que, há décadas, discutem o binômio processo-produto, - debate infindável. E que assim permaneça: algumas polêmicas e debates alimentam mais a arte do que as respostas definitivas. Nesse artigo, interessa-nos discutir e problematizar a relação processo-produto focando a questão da educação, do ensino e do aprendizado de arte em escolas, associações, ONGs, e instituições.
Vale, inicialmente, mesmo que de forma concisa, vermos como essa polêmica acontece no meio artístico, arena principal do debate. Pensar a arte como produto significa lançá-la às leis de mercado, adequá-la ao mercado, torná-la mercadoria consumível em escala industrial. Partidários dessas idéias são os empresários da mídia, os gerentes da indústria do entretenimento e os artistas que conseguem de alguma forma sustentar-se como um elo dessa cadeia de produção. O público nesse caso é visto apenas como comprador/consumidor, ele abre mão da sua cidadania-cultural em nome da lei da oferta e da procura. - A ausência de políticas públicas razoáveis para a arte mostra que essas idéias encontram eco nas três esferas de governo.
Os partidários da arte como processo estão sempre muito bem embasados pelas teorias acadêmicas (algumas pseudo-acadêmicas) de que a arte está sempre em movimento, de que a arte é o movimento criativo e, portanto, não há necessidade de um produto final. Para muitos desses artistas/acadêmicos/críticos/intelectuais finalizar um produto pode até mesmo ser visto como algo conservador e arcaico.
Infelizmente, algumas vezes, o embasamento teórico utilizado pelos partidários da arte como processo é utilizado também para justificar falta de acabamento, indefinição da dramaturgia, falta de ensaio, imprecisão técnica, improvisação desestruturada, descaso com o público. O produto é entendido por muitos desses artistas/acadêmicos/críticos/intelectuais como algo fechado e inacessível, sem retorno e sem chance de mudar. Algo intocável após a estréia, após a abertura da exposição, após a primeira edição ou audição.
O produto visto apenas como algo enrijecido, cristalizado, imóvel, possivelmente também será visto como algo sem importância. Isso talvez explique porque muitos artistas se recusam a apresentar um resultado palpável, deturpando a idéia de “work in process” (trabalho em processo) – muitas vezes os trabalhos nem ao menos são compartilhados com o público, pois estão eternamente em “processo”.
O discurso da arte como processo algumas vezes apenas está mascarando um certo medo de assumir uma posição, de expor-se, de revelar as reais competências e preferências estéticas – coisas que um produto tornaria claras e inequívocas. Baseados na arte como processo, espetáculos de dança nunca estréiam, poemas vão ficando nas gavetas, canções ficam apenas nas cabeças, peças teatrais não passam de laboratórios e exercícios intelectuais.
Nunca chegar ao público, muitas vezes por medo da crítica de outros pares - que também nunca se expõem com um produto - é fazer arte? Ser artista? Compartilhar o trabalho com o público não seria justamente o momento em que ele se completaria?
No caso das artes de performance (dança, teatro, música), o produto compartilhado mobiliza-se e é recriado justamente em função do encontro com os espectadores. Aqueles que já tiveram a experiência de entrar em cartaz - apresentar o produto mais de uma vez pelo menos - sabem o quanto o espetáculo entendido como “pronto” modifica-se, cresce, encorpa, sofre constante transmutação a cada encontro com o público. Ou seja, produto finalizado não precisa ser visto como sinônimo de produto final. Finalizar um produto não precisa ser sinônimo de acabar, de terminar, de cristalizar – a finalização e o contato com o público poderiam ser vistos como estar pronto para iniciar um novo e extraordinário processo de transformação.
Enquanto nos meios artístico-acadêmicos a polêmica processo-produto mobiliza teses, trabalhos e algumas verbas, no contato com a educação e o ensino de arte ela ainda gera mais resultados discutíveis do que discussão.
De modo geral, a escola parece reconhecer apenas os produtos. As exposições dos trabalhos de Arte dos alunos - coreografias, pinturas, peças de teatro - são apresentações únicas, nas feiras-culturais, nas mostras de dança do município, no encontro dos corais etc. Ou seja, o produto acaba sendo experimentado e vivido pelos alunos como algo realmente fechado e hermético, a primeira é a última chance de realizar-se o trabalho em sua completude, partilhado com a comunidade escolar. Isso, muitas vezes, compromete a escolha do tipo de trabalho a ser feito e a metodologia – processo - utilizada para sua realização.
Ainda, o fascínio pelo produto recebe importante apoio justamente na comunidade escolar – em geral, é do produto prontinho que os pais gostam, é a dancinha bem ensaiadinha que faz os diretores terem certeza do bom trabalho das professoras, são as musiquinhas acompanhadas de gestos bem decoradinhos – em geral a professora na frente fazendo para os alunos imitarem – que fazem os pais acreditarem que a escola é realmente “boa”. Muitos alunos só se sentem dançando quando chegam ao que eles chamam de “coreografia” (em geral como as da TV); muitos não se sentem atuando enquanto o jogo-teatral não vira “peça” (diálogos, entradas e saídas bem decorados); e a maioria não entende a necessidade da experimentação com cores e texturas, quer apenas ver suas pinturas (realistas) exibidas nas paredes.
Em outras instâncias – fora da escola, mas ainda escoradas num discurso pautado na Educação – o fascínio pelo produto move vultosas verbas e deferência papal aos seus criadores. São os superespetáculos prontos estrelados por crianças de baixa renda que atraem os grandes patrocinadores. Chamam esses mega-produtos de contrapartida social. Fortunas são gastas por empresários e agências do governo com grandes nomes da dança e do teatro, por meio de ONGs que só se justificam quando formalizam um espetáculo que mostre para o grande público o investimento que fizeram no “social” – com resultados que muitas vezes vão pouco além de uma apresentação escolar super produzida.
Novamente, a ênfase está no produto, naquilo que os outros podem ver, mostrar e, claro, comprar e vender, associar ao nome da empresa, do partido, do benfeitor, afinal, é uma imagem positiva, bem acabada, bem ensaiada e bem quista do ponto de vista da poltrona. O investimento apenas no produto artístico de certa forma completa o ciclo do consumo irrefletido e da arte como uma das formas de ganhar prestígio, dinheiro, votos, poder. - Que importância teria para grande parcela de empresários e políticos os processos pelos quais as crianças passaram até chegarem ao produto que encanta ou compra a mídia? E o artista que está ganhando, importa-se? Conhece processos educacionais consistentes?
Até mesmo nas escolas de samba vê-se este fenômeno: existem agora coreografias marcadas que são nítidos produtos bem decorados e acabados, criados por coreógrafos contratados, algumas vezes sem relação nenhuma com a comunidade – palavra que vive seu apogeu em todo carnaval. Mesmo os trios elétricos, os corsos, o carnaval de clubes, todos eles pressupõem, ou impõem, o conhecimento das danças da moda (passos seqüenciados), ou seja, mais produtos, sendo esses, de consumo popular. Até a febre - inicialmente paulistana - pelos repertórios de danças brasileiras também revela uma ênfase no produto, pois, na maioria das vezes, as danças são aprendidas somente a partir da cópia e muitas vezes se presta apenas ao uso/exibição ou à reprodução via ensino.
No que concerne à educação formal, o debate processo-produto revela-se somente diante de resultados, das produções e apresentações de arte já quase inerente às escolas; um debate real, teoricamente embasado que vise transformar as práticas, ainda é muito incipiente.
Enfrentando a imensa maioria de professores reprodutores de atividade e produtores de festinhas, há os professores e coordenadores que lutam arduamente contra o produto “acabadinho”, apresentado pelo professor e copiado pelos alunos. São os defensores da arte na escola como processo. Muitos deles são os que acreditam que “arte na escola é diferente”, “arte na escola não existe para formar artistas, e sim indivíduos”, “o aprendizado significativo está no processo, e não no produto”. Essa visão da arte foi em grande parte responsável pelo “laissez-faire” (“deixar fazer”) da década de 1970 e também pelo desprezo e condição miserável da arte na escola hoje, pois, para a maioria desses mesmos educadores, “a arte é auto-expressão” e não conhecimento. Assim, a arte, durante décadas, foi vista na escola como qualquer coisa que expressasse o interior intangível dos alunos/crianças. Em muitas escolas, ainda hoje, essa visão prevalece, se não a do “laissez-faire” propriamente dito, encontramos a da ênfase apenas no processo, tudo regado a um certo descuido em relação aos produtos.
Em geral, o grupo de pesquisadores, professores, coordenadores que se apegam ao processo estão preocupados com a ênfase histórica da escola na produção de pecinhas, dancinhas, musiquinhas somente para serem exibidos nas festas, desconectados de qualquer projeto político-pedagógico – preocupação muito justa, importante e necessária. Os defensores atuais do processo, principalmente nas séries iniciais, temem a falta de consciência da importância da metodologia, temem a negligência em relação à construção do conhecimento pela criança – temor justo, importante e necessário. Mas, não estariam eles mesmos negligenciando a arte como conhecimento ao não se preocuparem também com o produto? - em seu sentido móvel e em constante transformação.
O que pensaria a comunidade escolar se o professor de Matemática aceitasse e incentivasse trabalhos de alunos em que os resultados das contas estivessem errados – ou seja, produto mal acabado, até mesmo equivocado? No mínimo, o conhecimento desse professor seria questionado e sua disciplina encarada sem respeito. Por que, então, no que concerne à Arte, os produtos podem ser “qualquer coisa”, contanto que tenham sido trabalhados processualmente e permitindo ao aluno que construa seu “conhecimento” em Arte? - Será que a preocupação também voltada para o produto não seria um caminho para que a Arte nas escolas não fosse tão desprezada? Será que se comprometer com um produto finalizado não educa?
Em termos educacionais seria interessante hoje pensarmos nos processos que se completam nos produtos, nos produtos que revelam os processos. Sabemos que isso não é exatamente uma novidade, principalmente nos meios artísticos, mas sabemos também quão pouco esse pensamento transforma-se em prática nas escolas.
Os produtos vistos nas escolas revelam elementos importantes dos processos a que foram submetidos os alunos. Nas festinhas ou espetáculos encomendados, revela-se do “laissez-faire” dos professores à ditadura das cópias ou dos artistas convidados; revela-se de maneira clara o grau de conhecimento das linguagens artísticas em si que os professores ou artistas convidados possuem; revela-se o domínio que os professores ou artistas convidados têm da Pedagogia da Arte. E, muitas vezes, os produtos apresentados revelam também a importância e o valor que se dá à arte como forma de conhecimento na instituição.
Os professores muitas vezes não estão preparados para construir produtos que sejam resultados de processos artísticos significativos tanto para os alunos quanto para a sociedade em que vivemos. Os artistas muitas vezes não estão preparados para construir produtos que sejam resultados de processos educacionais significativos tanto para os alunos quanto para a sociedade em que vivemos.
Talvez mudar a formação – e a situação profissional -, tanto dos professores quanto dos artistas, pudesse iniciar a transformação que julgamos necessária: fazer com que os alunos sejam os protagonistas dos processos de ensino-aprendizagem sem deixar de lado a qualidade dos produtos desenvolvidos e o conhecimento das linguagens artísticas, estabelecendo, assim, os papéis essenciais do processo e do produto numa relação realmente dialógica no ensino de Arte.
Isabel Marques e Fábio Brazil são diretores do Instituto Caleidos, São Paulo/SP
Artigo originalmente publicado no site Carta Maior

 

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